sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Bi

Já te disse que te amo? Da falta que me fazes?

Não me pude despedir de ti. Eles não deixaram. Sabes isso não sabes? Fiquei uns dias em casa dele e foi tão estranho quando ele me foi buscar para retornar a uma casa sem ti. Sabes o que ele me disse? Sabes como foi quando me contaram?

Vou ser egoísta. Preciso de ser. Eu tinha 11 anos. Sabes o que me fizeste? Sabes como me deixaste? Deixaste-me sozinho... sim, sozinho. Ainda demorou um tempo até perceber isso. Mas eu nunca tive uma família. Só te tive a ti. Elas bem o disseram. Eu ouvi mas não escutei. Ou não quis escutar. Não percebia porque elas diziam que ele me ia enviar para o meu pai. Como assim? Não fazia sentido nenhum. A minha família não era esta?

Sabias que a dada altura já não me interessava viver mais? Sabias que quase desisti? Percebeste o que me ia na alma? No coração? O quanto a vida não fazia sentido sem ti? Odeio ter-me habituado. Odeio não precisar tanto de ti como antigamente. Sinto que em muitas coisas parei naquele tempo.

Hoje tenho outra família. Aquela que deveria ter tido desde sempre. Passaram-se anos mas finalmente encontrei-os. E encontrei a minha querida avó. Estás com ela? Toma conta dela que também a adoro. Tive tão pouco tempo para estar com ela. Ela era como tu. Uma santa. Uma querida. Um amor de pessoa. Tomem conta uma da outra. Eu sei que vocês davam-se bem.

Sabias que ele me bateu? Por querer ir aos anos do meu melhor amigo? Sabias que me atirou à cara ter perdido um negócio quando eu ainda estava de cama a recuperar da quimioterapia? Por me ter ido buscar ao hospital? Ele fez-te o mesmo? Viste como ele nos tratou? Viste o que ele fez? Não percebo. Juro que não percebo. Não percebo como estavas com ele.

Lembras-te que passados uns dias ouvi o teu sino? Eras tu? Estavas lá? Como quis que estivesses apesar do assustador que isso possa soar. Às vezes ainda te procuro na escuridão. Atraso o acender da luz para ver se apareces mas nunca estás lá. Procuro a fé que tinhas e que perdi única e exclusivamente para me sentir mais próximo de ti.

Já raramente rezo. Há uns tempos rezei. Pelo pai dela e pela minha avó. E tal como quando rezei por ti, não resultou. Sinto-me de novo um filho abandonado. Sabes que o odeio não sabes? Que por muito que o tente ignorar ou fingir que não existe... continuo a precisar dele para nele depositar o meu ódio. Neles a bem dizer.

Agora apercebo-me que te estou a tratar por "tu". É estranho. Nunca aconteceu em vida e provavelmente nunca viria a acontecer. Mas neste momento não me faz sentido ser de outra forma. Importas-te? Sinto-me mais perto de ti assim...

No outro dia chorei. Não sei porquê. Não conseguia sequer falar. Estava a tomar banho e comecei a chorar. A pensar em ti. A pensar em nós. Ela estava lá para me confortar e acho que ninguém o teria feito melhor que ela. Ela compreende-me. Ela sabe. Eu contei-lhe. Deixei-me cair na banheira enquanto enchia e perdi noção do tempo. Queria que voltasses.

Às vezes penso em ti. Penso na falta que me fazes. Estás triste comigo? Estás desiludida? Tenho medo da resposta. Tento viver com o que me ensinaste, com os princípios morais e cívicos com que me educaste e receio nem sempre viver de acordo com as expectativas. Penso na pessoa em que me teria tornado se não me tivesses deixado.

Tantas vezes senti a tua presença. Tantas vezes senti que continuavas a tomar conta de mim. Que continuas a olhar por mim. Mas isso não me chega. Quero poder abraçar-te. Dar-te um beijinho de manhã antes de sair de casa.

Lembras-te quando me ias buscar à natação? Levantavas-me e punhas-me em cima do banco e enrolavas-me na toalha. E quando estava seco davas-me sempre aquele tupperware azul com mini palmiers ou sortidos húngaros. Ou quando me preparavas o pequeno-almoço. Pensal. E quando me deitaste pimenta na lingua por ter dito um palavrão? Lembro-me que nunca mais repeti... enquanto foste viva.

Já viste os teus netos? Estão lindos não estão? Sabias que te vejo neles? E no pai... sim no teu filho. No outro dia fui a casa dele e vi uma foto de vocês os dois. Como foi bom ver a tua cara de novo. Estavas linda tal como sempre te recordei. Lembras-te de quando íamos para a missa e caíste? E eu não te consegui levantar e chorei? Lembro-me também da nossa viagem a Londres, do Madame Tussauds, do hospital e das tuas amigas.

Preciso de te pedir desculpa. Preciso de te dizer que estou arrependido de não te ter ido ver mais vezes ao quarto. De não te ter dito vezes suficientes que te amava e que nunca te poderia retribuir tudo o que fizeste por mim. Por me ter deixado ir abaixo e não ter seguido o caminho que querias que tivesse seguido. Vês? Já estou a chorar outra vez. Fazes-me tanta falta.

Tenho saudades tuas. Amo-te.
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