quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

O derradeiro tio


Pois é. Parece que vou ser tio novamente e desta vez é uma menina. Neste momento conto com 3 sobrinhos e 1 sobrinha. Infelizmente ainda não conheci a minha sobrinha mas essa é uma falha que pretendo remediar em Março. A balança começa assim a equilibrar-se.

"Quero ver que tipo de brinquedos e de conversas vais ter com uma menina!" - escreveu ela seguido de uma risada.

Pois. Também não sei. Apenas tenho experiência prática em ser tio de 2 rapazes e a chave do sucesso no meu relacionamento com eles é ser uma criança grande. E como alguém uma vez disse, a diferença entre um homem e um miúdo, é o preço dos brinquedos. Para mim é muito fácil entrar numa loja de brinquedos e perder-me. De comprar-lhes coisas como se o fizesse para mim. De os ajudar a passar níveis de jogos na playstation e de jogar futebol.

Uma rapariga... bom. Também há outras coisas que sei fazer. Posso ajudá-la com os trabalhos de casa, ensiná-la a nadar ou a andar de bicicleta. Posso ir jogar ténis com ela ou jogar playstation. E pode até ser que goste de andar de mota. Pelo menos a mãe dela gosta. Agora que penso nisso vamos poder fazer muita coisa juntos.

Pois é minha querida. Vais ver que vai ser giro. Fico à tua espera.

quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

Galeto



Primeiro dia do ano. Como seria de esperar, acordei tarde e com aquela desconfortável sensação de desidratação e fome. Levantei-me e fui até ao frigorífico, apenas para descobrir que pouco ou nada tinha que me pudesse saciar, para além de um chouriço. Não tardou para que me perdesse nas inúmeras formas de colmatar a fome com aquele chouriço. Pensei  em pão com chouriço mas rapidamente coloquei a ideia de parte visto não ter pão em casa. Pensei numa bela ervilhada com ovos escalfados, mas não tinha mais carne para acompanhar aquele chouriço. Ai se eu tivesse umas entremeadas e uns pedacinhos de vitela! Chouriço e morcela assada com uns ovinhos estrelados no pão e batatas fritas... caraças! Não tinha pão, morcela e em boa verdade nem as batatas fritas. Chouriço com iogurte? Não me parece. Fiquei desanimado. Olhei para a porta do frigorífico e para além dos 5 ovos e variados frascos de maionese, mostarda dijon, ketchup e pickles... tinha um litro de leite e meia garrafa de Perrier. A coisa não estava a correr bem. Não ia conseguir comer nada de jeito em casa. Dei um gole na água e voltei a fechar o frigorífico. É claro que poderia fazer uma massa, pensava agora eu, enquanto vasculhava o armário. Latas de milho, feijão, grão, ervilhas, cogumelos, tomate pelado e diversos pacotes de massas variadas. Voltei ao frigorífico. Sim. Tinha pacotes de natas também. Os meus olhos brilhavam por esta altura, enquanto procurava ansiosamente algumas fatias de queijo para fazer uma pratada de massa. Nada. Não acredito. Deixei acabar o queijo também. Desisto. Vou sair.

Um combinado nº 10, um prato de esparregado e batatas e uma imperial. Foi tudo o que precisei para me sentir "aconchegadinho". Não costumo variar muito. Era este ou o nº 8 com um sumo de laranja natural. Já frequento esta casa desde miúdo. Desde que vinha com ele depois de passarmos na feira popular. Ele era um habitué e se bem me lembro era o único local aberto às horas que queríamos. Passados cerca de 15 anos continua tanto quanto sei a ser a única alternativa em Lisboa para uma refeição decente a partir das 2 da manhã.

Moral da história: tudo se resume a uma boa gestão. Gerir uma casa é como gerir um negócio. Uma má gestão de recursos resulta invariavelmente na perda de tempo e capital. Podemos ainda assumir que tempo é dinheiro pelo que este último é indubitavelmente o mais afectado. Ao sair de casa, perdi conforto, tempo e dinheiro.

E tudo isto porque este ano ainda não fui às compras.

sábado, 27 de dezembro de 2008

O cubo mágico


Nunca tive um cubo de Rubik. Lembro-me do meu irmão ter um e de me terem dado um magic puzzle de Rubik. Parece-me lógico evitar dar a mesma prenda a 2 irmãos. Mas não se resumiu a isso. Sempre fomos diferentes. Ele teve aulas de viola e eu de piano. Ele frequentou aulas de futebol e judo e já eu andava no basket e na natação. Ele tinha um estojo com ilustrações de Fórmula 1 e eu do Moto GP. Ele quis e seguiu Direito e eu quis seguir Engenheria. Até aqui fui diferente ao não seguir nada. Não admira a falta de pontos em comum. Ele casou e teve dois lindos miúdos e já eu... bom, ainda ando a resolver algumas camadas do meu cubo.

Este Natal ofereceram-me um cubo mágico e com ele, uma alusão à vida.

Muitas vezes pensei sobre a vida. Sobre o meu percurso nesta nossa longa caminhada. E verdade seja dita que é dos momentos atribulados que melhor me recordo. Creio que é por serem os momentos mais marcantes. Ou pelo menos para mim foram. E agora que penso nisso, por si só, esta afirmação já diz muito acerca da minha vida. É através dos obstáculos que ultrapassamos, das divergências que fechamos em concordância e dos desafios que falhamos, que aprendemos e crescemos. Sim, também estes últimos, porque não aprendemos apenas com os nossos sucessos mas também com as nossas falhas. Porque a lição raramente se encontra no resultado mas na forma como lá chegamos. Nas alternativas que colocamos. Nas opções em aberto. Na postura com que enfrentámos cada uma delas. No raciocínio. Na pertinácia com que as acatamos.

Não são muitas as pessoas que me conhecem na íntegra. Mas gosto de me dar a conhecer. E sinto cada vez mais essa necessidade à medida que as pessoas se vão tornando mais importantes para mim.

"O quê? A sério? Não sabia... e tens seguido isso ou tenho de te dar um par de estalos?" - disse ele.

Gosto de conhecer pessoas. E para isso procuro gerar oportunidades que me levem a conhecê-las um pouco melhor. De promover convívio. Sem expectativas. Não é disso que se trata. Não procuro um fim mas sim um meio. E vivo e tento viver uma coisa de cada vez. Quem me conhece sabe isso. Quem não me conhece só vai compreendê-lo depois de me conhecer. Para me conhecer de facto... vai ter mesmo de querer.

E nestes momentos, encaixamos mais uma peça no seu lugar. Não sabemos se ela está no seu lugar certo nem até quando lá permanecerá. Se vamos precisar de mudá-la de sítio. A importância daquela peça é relativa. Apenas se pode medir no seu próprio tempo e espaço e a sua constância passa para segundo plano. O que faz sentido hoje poderá não fazer amanhã. Não existe linearidade na forma como resolvemos o cubo. O cubo é orgânico. Vive. E cada passo que damos representa um novo passo no interminável mar de possibilidades para uma potencial solução e abre-se um infindável leque de novas opções. Num universo tridimensional que conta também com a 4ª dimensão para a chegada da solução.

A própria forma como jogamos com o cubo muda consoante a nossa idade, a nossa experiência e acima de tudo, a forma como apreciamos o jogo em si. Fosse mais novo e estaria tentado em fazer batota. Poderia procurar um guião que me ajudasse. Poderia dar a alguém que o jogasse por mim. Ou poderia até desmontar o cubo e montá-lo de novo a meu proveito. Às vezes cedemos e desistimos. Queremos respostas. Ansiosos por entrar naquela última camada, procuramos caminhos rápidos e fáceis. Fazemos batota. Hoje em dia jogo-o com outro olhar. Mais sereno. Mais calmo. Mais calejado. Gosto de jogá-lo e não tenho pressa em chegar ao fim.

Sim, tem várias cores. Sim tem várias soluções possíveis. Ou melhor. Diversas equações para uma única solução possível. Porque solução existe apenas uma. Aquele momento em que numa última rotação conseguimos colocar as 6 faces homógeneas. É esse o seu desfecho. É esse o desfecho da vida. E como não é nessa única certeza que temos na vida que reside a nossa alegria, então podemos apenas assumir que os prazer de viver se encontra nessas equações. Nesse caminho a percorrer. Nos tais obstáculos que existem não para nos assustar nem para gerar receio mas apenas para nos testar e recordar o porquê de estarmos ali. Para nos lembrar que merecemos estar à altura.

Sou paciente. Sei esperar. Sei lutar pelo que quero. A vida ensinou-me isso e muito mais. Ensinou-me também que a aprendizagem nunca cessa. Que as desilusões e as frustrações nunca terminam mas que não devemos desistir por medo de passar por elas. Nem o medo de falhar. Tornam-nos mais fortes. E enquanto experiências de vida enriquecem-nos e permitem-nos saborear de outra forma todas as outras alegrias. Já há muito tempo que deixei de ter medo. Que aprendi que sou eu quem determina o meu destino.

O medo não é a linha ténue entre os obstáculos e a minha realização pessoal. É a experiência. É a dualidade entre a vontade e perseverança face à história e ao cansaço. É a experiência que acarreta o pragmatismo. Que mata a cor e que deambula em graus de cinzento. E é essa luta constante que se confunde com a falta de vontade genuína. Que assume outras caras. Que confunde.

Comecei a jogar. É uma primeira camada do jogo. Conquistar uma face. O quadrado branco. Depois disso logo se verá.

Na vida só há uma certeza. A solução. Se esse grau de incerteza pode ser caracterizado como esperança? Duvido. Esperança requer fé. E não necessito de fé para com convicção afirmar que a vida é incerta. Que a esperança me ajude a viver com essa incerteza? Isso sim... concordo. 

Infelizmente nem tudo na vida é comparável ao cubo. Tento jogá-lo bem, apreciando cada rotação e não me focando tanto em terminar.

sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Bi

Já te disse que te amo? Da falta que me fazes?

Não me pude despedir de ti. Eles não deixaram. Sabes isso não sabes? Fiquei uns dias em casa dele e foi tão estranho quando ele me foi buscar para retornar a uma casa sem ti. Sabes o que ele me disse? Sabes como foi quando me contaram?

Vou ser egoísta. Preciso de ser. Eu tinha 11 anos. Sabes o que me fizeste? Sabes como me deixaste? Deixaste-me sozinho... sim, sozinho. Ainda demorou um tempo até perceber isso. Mas eu nunca tive uma família. Só te tive a ti. Elas bem o disseram. Eu ouvi mas não escutei. Ou não quis escutar. Não percebia porque elas diziam que ele me ia enviar para o meu pai. Como assim? Não fazia sentido nenhum. A minha família não era esta?

Sabias que a dada altura já não me interessava viver mais? Sabias que quase desisti? Percebeste o que me ia na alma? No coração? O quanto a vida não fazia sentido sem ti? Odeio ter-me habituado. Odeio não precisar tanto de ti como antigamente. Sinto que em muitas coisas parei naquele tempo.

Hoje tenho outra família. Aquela que deveria ter tido desde sempre. Passaram-se anos mas finalmente encontrei-os. E encontrei a minha querida avó. Estás com ela? Toma conta dela que também a adoro. Tive tão pouco tempo para estar com ela. Ela era como tu. Uma santa. Uma querida. Um amor de pessoa. Tomem conta uma da outra. Eu sei que vocês davam-se bem.

Sabias que ele me bateu? Por querer ir aos anos do meu melhor amigo? Sabias que me atirou à cara ter perdido um negócio quando eu ainda estava de cama a recuperar da quimioterapia? Por me ter ido buscar ao hospital? Ele fez-te o mesmo? Viste como ele nos tratou? Viste o que ele fez? Não percebo. Juro que não percebo. Não percebo como estavas com ele.

Lembras-te que passados uns dias ouvi o teu sino? Eras tu? Estavas lá? Como quis que estivesses apesar do assustador que isso possa soar. Às vezes ainda te procuro na escuridão. Atraso o acender da luz para ver se apareces mas nunca estás lá. Procuro a fé que tinhas e que perdi única e exclusivamente para me sentir mais próximo de ti.

Já raramente rezo. Há uns tempos rezei. Pelo pai dela e pela minha avó. E tal como quando rezei por ti, não resultou. Sinto-me de novo um filho abandonado. Sabes que o odeio não sabes? Que por muito que o tente ignorar ou fingir que não existe... continuo a precisar dele para nele depositar o meu ódio. Neles a bem dizer.

Agora apercebo-me que te estou a tratar por "tu". É estranho. Nunca aconteceu em vida e provavelmente nunca viria a acontecer. Mas neste momento não me faz sentido ser de outra forma. Importas-te? Sinto-me mais perto de ti assim...

No outro dia chorei. Não sei porquê. Não conseguia sequer falar. Estava a tomar banho e comecei a chorar. A pensar em ti. A pensar em nós. Ela estava lá para me confortar e acho que ninguém o teria feito melhor que ela. Ela compreende-me. Ela sabe. Eu contei-lhe. Deixei-me cair na banheira enquanto enchia e perdi noção do tempo. Queria que voltasses.

Às vezes penso em ti. Penso na falta que me fazes. Estás triste comigo? Estás desiludida? Tenho medo da resposta. Tento viver com o que me ensinaste, com os princípios morais e cívicos com que me educaste e receio nem sempre viver de acordo com as expectativas. Penso na pessoa em que me teria tornado se não me tivesses deixado.

Tantas vezes senti a tua presença. Tantas vezes senti que continuavas a tomar conta de mim. Que continuas a olhar por mim. Mas isso não me chega. Quero poder abraçar-te. Dar-te um beijinho de manhã antes de sair de casa.

Lembras-te quando me ias buscar à natação? Levantavas-me e punhas-me em cima do banco e enrolavas-me na toalha. E quando estava seco davas-me sempre aquele tupperware azul com mini palmiers ou sortidos húngaros. Ou quando me preparavas o pequeno-almoço. Pensal. E quando me deitaste pimenta na lingua por ter dito um palavrão? Lembro-me que nunca mais repeti... enquanto foste viva.

Já viste os teus netos? Estão lindos não estão? Sabias que te vejo neles? E no pai... sim no teu filho. No outro dia fui a casa dele e vi uma foto de vocês os dois. Como foi bom ver a tua cara de novo. Estavas linda tal como sempre te recordei. Lembras-te de quando íamos para a missa e caíste? E eu não te consegui levantar e chorei? Lembro-me também da nossa viagem a Londres, do Madame Tussauds, do hospital e das tuas amigas.

Preciso de te pedir desculpa. Preciso de te dizer que estou arrependido de não te ter ido ver mais vezes ao quarto. De não te ter dito vezes suficientes que te amava e que nunca te poderia retribuir tudo o que fizeste por mim. Por me ter deixado ir abaixo e não ter seguido o caminho que querias que tivesse seguido. Vês? Já estou a chorar outra vez. Fazes-me tanta falta.

Tenho saudades tuas. Amo-te.

domingo, 21 de dezembro de 2008

Tudo o que é bom acaba



"Que dizes a um almocinho... estilo consoada na praia?" - perguntou ele.

A ideia pareceu-me desde logo óptima. Já tinha saudades de estar com eles. Lembrei-me da Arrifana,  do surf, do mar, de copos e churrascadas. Contem comigo!

"Então tio desaparecido. Esqueceste-te de nós?" - escreveu ele.

Não me esqueci de vocês meus queridos. Infelizmente estava a trabalhar e não me parecia que fosse conseguir sair a tempo de vos ir visitar. A noite parecia não ter fim. E com ela o projecto em mãos. Pensava agora no almoço do dia seguinte e a que horas teria de acordar. Bebia outro café e continuava. E com isto as horas passaram e o sol nasceu.

"Tou... sou eu. Então? Esqueceste-te do almoço?" - perguntou ela.

Quem? O quê? Ainda demorei uns bons minutos a perceber com quem tinha estado a falar. Parecia que tinha sido atropelado por um camião. Olhei para o relógio e compreendi o porquê. Eram 13:00 e tinham-se passado cerca de 4 horas desde que me tinha deitado. A custo levantei-me, movido pela saudade, e fiz-me à estrada rumo à praia.

Lá se encontrava a mítica "pão de forma". À volta dela, o grupo do costume e um par de caras desconhecidas. As pranchas enceradas e estendidas à volta da carrinha serviam de porta estandarte. As espetadas e as salsichas acabadas de sair da grelha circulavam e não se passaram dois minutos sem ter um copo de vinho na mão. Tudo o que era preciso estava ali. Um grupo de amigos, um grande ambiente de convívio e borbas para dar e vender.

"Já viste o que me deram no amigo secreto da empresa?" - dizia ele sorrindo e apontando para a cabeça.

Confesso que não sou grande apreciador de bonés mas aquele era um status! Se encontrar igual mas em preto... compro um. Uma GS é sempre uma GS.

Falámos de surf e do mar. De uma suástica que afinal não existia. De uma cruz maltesa que se assemelhava à do barão vermelho. Das viagens de mota a Marrocos, à Escócia e ao sul de França. Dos lobos da neve e daí para a neve em si. De quem vai e de quem foi. Da economia de direito. Das histórias da vida de cada um. E comíamos e bebíamos com gosto...

"Onde é que anda o fotógrafo?" - gritou ele.

As horas passaram e chegava a hora de dispersar. A "família" juntava-se agora para a foto de grupo. Coloquei a máquina em cima de um dos carros e corri. Despedimo-nos e infelizmente...

...tudo o que é bom acaba!

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

Veni, vidi, vici...


O dia de hoje foi bem mais curto do que é habitual. Talvez justificado pela noite prolongada de ontem. Mas acerca dessa prefiro nem falar. E até nem é por não querer. É mais por nem saber por onde começar. Pelos "dinamites"? Digo apenas que mais uma vez as festas da empresa estiveram ao mais alto nível.

"Tens 2 meses para te preparar..." - disse ela a rir-se.

Cheirou-me a desafio. Percebi que se referia ao braço e à incapacidade de conseguir jogar nos próximos tempos. Em tom de brincadeira disse-lhe que já estava preparado há anos. Quanto muito poderia era passar 2 meses a aquecer. É claro que se ela for em ping-pong metade do que é em padel... estou bem tramado. Bom. Pensando melhor, é melhor ir treinando.

"Encontramo-nos no liceu francês." - disse eu.

Parece que ele lá conseguiu convencer o cunhado a aparecer com uma carrinha grande o suficiente para levarmos a mesa. Dito feito. Fomos os 3 à Decathlon, comprámos a mesa e ele ainda comprou uma raquete "especial de corrida". Verdade seja dita que até à data a raquete não tem abonado a favor.

Quando chegámos à Fullsix, começámos a montar a mesa e mandámos vir pizzas. A noite prometia ser longa. E quando acabámos de montar a mesa, a excitação era tal que nem a tirámos do lugar. Onde estava foi onde ficou. Pelo menos nos 3 ou 4 primeiros jogos. Num laivo de racionalidade e inteligência, acabámos por admitir que na entrada é que se jogava bem e assim foi. A nostalgia e o vício do jogo impelia-nos a continuar a jogar cada vez mais. Estávamos cansados mas não conseguíamos parar de jogar.

"Vá... este é mesmo o último!" - dizia ele pela sétima vez.

Há quem lhe chame a "mesa do César". Não deixo de achar piada e rir-me, mas acabo sempre a refutar a ideia. A mesa não é minha. É de todos. Mesmo daqueles que não contribuiram para ela. Combinam-se agora torneios, desafiam-se uns aos outros e há até quem tenha começado a almoçar sandes para chegar à mesa primeiro.

"Bom. Ainda bem que me convenceste a comprar uma rifa!" - disse ela enquanto segurava no filho.

Se é um sucesso? Acho que sim. Acho que olhando para trás todos estão contentes por se terem deixado levar na conversa da rifa a 1 euro. Ela pelo menos tem de estar visto que aquelas 2 rifas lhe valeram o primeiro prémio. Rio-me. Penso se ela não preferia ter abdicado do prémio e evitado toda a exposição a que esteve sujeita.

"Sr. César... se me der 20 de avanço vou lá acima jogar consigo." - disse ele.

Os próximos passos? O próximo objectivo? Acho que ainda temos um bom caminho a percorrer. Eles falam das mais variadas coisas, desde o saco de boxe à mesa de bilhar, passando pelas humildes setas ou até pelo mini-golfe. Até que ponto são ou não viáveis... isso logo se vê. Uma coisa é garantida: vou continuar a dar voz ao que todos querem e a tentar torná-lo possível. 

domingo, 14 de dezembro de 2008

Os amigos do garfo


Eram 10 da manhã. A chuva e o vento teimaram em aparecer, mas nem mesmo estes nos demoveram de um último passeio. Tínhamos tudo o que precisávamos: a companhia de quem já partilhou muitos e bons quilómetros e um roteiro gastronómico.

"Vai desejar salmonete? Robalo? Dourada?" - perguntou ele.

Já não o via há algum tempo. Não desde que foi morar para a Polónia. Da última vez que estivemos juntos fomos os três almoçar a Rio Maior. Depois veio o acidente... e nunca mais o vi. Foi bom vê-lo e dar-lhe um abraço. Foi bom ver que estava bem e pronto para mais curvas.

"Se quiserem... ficam em minha casa em Londres e depois seguem!" - disse ele.

Falávamos da viagem à Escócia. Não era uma viagem nova. Já tínhamos considerado esta viagem no ínicio do ano, assim como a viagem a Marrocos. Infelizmente, nenhuma das duas se concretizou. O nosso presidente ausentou-se durante uns meses e verdade seja dita que isso fez toda a diferença. Faltou-nos um elo agregador. Uma peça basilar do nosso motoclube. Os encontros semanais na sede passaram a ser mensais e os ânimos motociclísticos deixaram-se esfriar com o tempo. 

"Vai desejar salmonete? Bica? Carapau?" - perguntou ele.

Salmonete. Confesso que apesar da viagem em si me entusiasmar, o facto de a quererem fazer em apenas uma semana me deixou meio apreensivo. Ao contrário deles, não acredito que se faça facilmente. Ou melhor... não é que não se faça, mas será garantidamente uma viagem a "devorar" quilómetros. Uma média de mil quilómetros diários? Durante sete dias? Quero visitar lugares e conhecer pessoas, comer e beber bem, assimilar culturas, tirar fotografias, quero repousar... quero memórias e experiências. Não procuro uma viagem frenética cujo expoente máximo seja a vanglória dos tempos e quilómetros percorridos. Não. Para isso não contem comigo. Não estou para aí inclinado.

"Vai desejar salmonete? Espada branco? Ovas? Salmão?" - perguntou ele.

Salmonete. Pensei no sul de França. Lembrei-me de um filme que havia visto há uns meses atrás, que apesar de se passar na California, traduzia quase na íntegra aquilo que procurava. Fiquei de pesquisar sobre isso. Sim. Soa-me bem. Salmonete. Uma viagem de uma semana pelo sul de França, turismo rural, visitar os "chateaux" e os campos vinícolas, cultivar-me em provas de vinho e na famosa gastronomia da região. Tirar muitas fotografias e fazer muitos quilómetros. Aproveitar as curvas dos pirinéus. Salmonete. O melhor de dois mundos.

"Vai desejar salmonete? Choco? Polvo?" - perguntou ele.

Salmonete. Por esta altura interroguei-me no porquê de salmonete ser uma constante. As migas de coentros e beterraba estavam uma delícia. A batata cozida e a salada traziam harmonia à mesa. E os jarros de vinho? Um era demais e 1000 não chegavam! Sei que te estás a rir...

"Vai desejar..." - e tive de o interromper com um redondo não!

Penso agora na velha máxima "Live to ride, ride to live" e traço um novo paralelismo com o que julgo todos sentirmos. Conduzimos como vivemos. Não se equipara a importância do destino ao caminho percorrido para lá chegarmos. São as estradas que nos movem e conduzem. É nos trilhos sinuosos que encontramos prazer. Uma adrenalina que nos faz sentir vivos. É quando paramos que medimos na extasiada expressão de cada um a qualidade de um novo troço. E frequentemente voltamos a visitar terras e lugares por causa das suas "curvas".

"E vais com este tempo?" - perguntou ela.

E porque não?

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

E o próximo vai para...



"Obrigado, obrigado, obrigado... obrigado, obrigado, obrigado!" - dizia ele baixinho para o microfone, à medida que fazia vénias para um público extático.

A noite não começava das melhores formas. O stress do costume. Nós a querermos sair e os pedidos de alterações por parte dos clientes a chegarem. Muitos haviam já descido para a tradicional cerveja, outros seguido o seu caminho... e nós os 5 havíamos ficado para trás. Havíamos... salvo seja. Confesso que fiquei mais pela companhia do que propriamente pelo trabalho. Já eles...

"Eles este ano esmeraram-se... ora aí está uma bela produção!" - disse ele.

Trabalho terminado, era hora de seguir para a festa. Eles já não tinham cabeça. Compreendi... mas foi pena. Tinha sido bom irem. Era uma forma de verem o nosso trabalho reconhecido.

"Alguém sabe como é que se vai para lá?" - perguntou ele.

Chegámos. Os gin tónicos começaram rodar. Foi bom encontrar caras há muito perdidas, um dedo de conversa e venha lá outro gin tónico. A música de Vangelis e o levantar das cortinas revelava agora um ringue de boxe. O ringue onde todas as agências de marketing se iriam defrontar na incessante busca pelo prémio final. O prémio da noite. O cinturão dourado.

"Nunca mais nos chamam? Mas afinal estávamos nomeados para quantos?" - perguntei eu.

Ela levantava os ombros e acenava com a cabeça indicando desconhecer. As nomeações continuavam. Os sapos desapareciam. E nós... nada.

"E os nomeados são..." - dizia ele alto e em bom som.

Era agora. O momento esperado. O momento pelo qual havíamos aguardado toda a noite. E não foi com surpresa que ele chegou. Que o acolhemos. Tínhamos todos trabalhado para isto.

"Eu não vou... achas? Não contribuí em nada para isto... mas compreendes, certo?!" - dizia ela com a sua habitual formalidade.

Disse-lhe que sim. Para ser sincero... não sei se compreendo. Pensava em mim mesmo um ano antes. Isso não me havia impedido de subir ao palco.

Ele continuava a desferir murros e pontapés no saco que haviam colocado para esse fim no meio do ringue. O que nos ríamos. A noite era nossa. 1 bronze, 1 prata e 7 ouros, entre eles o prémio da agência do ano 2008.

Parabéns Fullsix.

domingo, 23 de novembro de 2008

Shrek


Titan, Tiger, Manucha, Rambo, Safira, Mouse, Xira, Sabú, Caniço, Velo e Nino.

Entre outros, estes são os cães da minha vida. Pastores Alemães, Dobermans, Boxers, cruzados e 1 cachorrinho Rotweiller de que nunca me irei esquecer. E agora o Shrek. É certo que o Shrek não é meu... mas sendo dos meus sobrinhos, é como se fosse. Não deixa de ser da "família". O mais recente membro da família. Adoro cães. Aliás... amo cães. Custa-me actualmente não ter um mas assim que tiver espaço... é garantido.

Durante meses ouvi os meus sobrinhos a pedirem um cão e várias vezes ouvi o meu irmão e a minha cunhada resistirem à ideia. Finalmente, acabaram por ceder. Infelizmente, este pedido acabou por se revelar mais como um capricho do que propriamente um acto de necessidade, carência ou amor.

"Mas sabes... ainda assim acho que tá a ser bom para ele. Sabes que ele tem medo de cães, não sabes?" - perguntou ela.

Por acaso não. Não sabia. Não me recordo tão pouco de ele ter tido alguma experiência com algum cão que lhe pudesse ter incutido qualquer tipo de receio. Eu lembro-me perfeitamente de ter sido mordido duas vezes por cães em miúdo e nunca tive medo deles.

"Quando brincares com ele... dá-lhe uma recompensa!" - disse eu.

Eles brincavam agora com o Shrek no chão da cozinha. Por momentos foi como se não existisse mais nada. Deixei-me ficar sentado a olhar para os 3 a brincar com a garrafa de água. E sorri.

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Hodgkin - parte I

Lembro-me, ainda que vagamente, de algumas das caras. Mas mais do que caras, lembro-me das circunstâncias que nos uniram, dos episódios que nos marcaram. Lembro-me dele mais do que de qualquer outro. Será por termos partilhado um quarto? Será por ter sido o meu primeiro amigo de cor? Ou seria por ter apenas uma perna? Pelos gritos de dor e sofrimento não foi... porque naquele sétimo piso, foram raras as noites em que não houvesse alguém a gritar por alguém.

Era noite e recordo-me nitidamente de estar cansado. Talvez já me devesse ter ido deitar. Mas era miúdo. E nessa altura tentava sempre ficar acordado até um pouco mais tarde. Fazia-me sentir adulto. Tinha nesta altura 12 anos. Entrei na sala e dirigi-me ao sofá de dois lugares. O meu irmão via televisão como habitualmente àquelas horas. Eu fazia o mínimo barulho possível para que ele não desse por mim. Talvez assim ele não me mandasse para a cama.

"Vai-te deitar. Amanhã é dia de colégio..." - dizia ele.

Normalmente fingia não ouvir. Ou então pedia para ficar apenas mais 5 minutos. Não nessa noite. Nessa noite eu não desci para ir ver televisão. Não desci por querer companhia. Não desci para ficar acordado até mais tarde. Não. E definitivamente estava longe de me querer tornar mais adulto. Entrei na sala. Sentei-me no sofá... e gradualmente deixei de respirar.

Lembro-me dele a gritar pelo meu nome, de colocar-me aos ombros, de descermos para o carro. Recordo-me de entrar nas urgências do hospital, de me colocarem numa maca, administrarem oxigénio, fechar os olhos... e acordar. Ainda estávamos na mesma noite. Não sei quanto tempo passou mas garantidamente era a mesma noite.

"O seu irmão teve um ataque de asma. Entretanto as análises ao sangue revelaram também estar com uma anemia por falta de ferro. Vamos mantê-lo esta noite por cá para fazermos mais algumas análises." - disse o médico.

Mal abria os olhos. Já há muito tempo que a minha asma não se manifestava. E nunca com esta violência. Havia deixado os vaporizadores e inaladores há já uns anos. Também já não frequentava o médico da asma. As aulas de natação tinham ficado para trás. Teoricamente a asma deveria ser problema do passado. Fiquei essa noite no hospital para observação...

"Houve uma complicação e infelizmente perdemos algumas das análises. Seja como for, existem alguns exames que gostaríamos de repetir, para clarificar uma possível situação." - disse o médico no dia seguinte.

Impressionante a forma como a nossa memória funciona. Consigo lembrar-me deste tipo de pormenores passados cerca de 17 anos. E quem me conhece sabe que eu mal me lembro do que jantei na noite anterior. Passados dois dias no hospital, chegou um diagnóstico para o qual o meu irmão não estava preparado. Não de novo. Não tão cedo.

"Como é que isso se pronuncia?" - perguntei.

Fui transferido para o IPO. Para o sétimo piso... departamento de pediatria. E foi aí que o conheci. Estava sempre a rir-se. E apesar de ter apenas uma perna, era dos que mais "corria" naquele corredor. Ficámos no mesmo quarto juntamente com mais 4 miúdos. Lembro-me mais das cicatrizes de cada um do que propriamente das feições. Nomes, esses, perderam-se com o tempo. Destes últimos não guardo recordações claras. Mas acho que é normal. Aquelas camas ao nosso lado tiveram uma rotatividade invejável. Talvez por não serem casos tão graves.
Esta era a minha nova casa. E nesta altura, eu ainda mal sabia o que esperar...
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